terça-feira, janeiro 17, 2006

Em entrevista...THERIOMORPHIC

«Enter the Mighty Theriomorphic foi um dos discos mais marcantes criados em território nacional durante 2005 por uma banda cada vez mais incontornável no que ao Death Metal lusitano diz respeito. A Opuskulo tentou conhecer um pouco melhor esta banda, o seu disco e os planos para o futuro através do mentor do projecto, e uma das vozes mais activas no underground nacional. Falo pois do baixista/vocalista Jó.
Após alguns falsos alarmes os Theriomorphic editam finalmente o seu disco de estreia ! O que levou aos sucessivos adiamentos para a edição deste disco ?
Foram vários factores. Cada passo teve atrasos e, no fim de todo processo, passaram-se cerca de 4 meses entre a altura inicialmente prevista para a edição e a saída efectiva do CD. Não foi nada que não aconteça a bandas e lançamentos de todo o lado. Quando se trabalha com prazos um pouco apertados, é natural que haja imprevistos. A nossa vontade e a da editora era a de ter o disco editado assim que fosse possível, mas depois foram surgindo atrasos com o grafismo do CD, porque recebi mais algumas imagens que não queria deixar de usar e pedi para se adiar o lançamento; entretanto, estávamos no Verão e lançar numa altura em que estava tudo prestes a ir de férias, não nos pareceu ser uma boa opção, porque depois nem se poderia promover em condições; depois, surgiram mais alguns atrasos, um problema com fotólitos, quando estava tudo na fábrica em Espanha, e também com a greve de transportadoras que lá houve, nessa altura. Acabámos por só conseguir editar “Enter The Mighty Theriomorphic” no dia 31 de Outubro.

Agora que o disco de estreia está cá fora, quais têm sido as reacções ao mesmo ?
Até agora, têm sido excelentes. Penso que, no geral, o trabalho está a agradar a praticamente toda a gente, mesmo quando não são apreciadores do género. As críticas que já foram feitas também confirmam isso. Acima de tudo, acho que o álbum está a conseguir impressionar e surpreender as pessoas. Muita gente diz que ouve o disco repetidas vezes com prazer e isso é a melhor reacção que pode haver.

Todo o trabalho de gravação e produção do disco foi realizado em Portugal e por portugueses, certo ? Achas que é um desperdício de dinheiro aquilo que algumas bandas portuguesas têm feito ao procurar estúdios e produtores famosos internacionalmente para trabalhar nos seus discos ? Os padrões de qualidade estão cada vez mais próximos… concordas ?
Sim, foi tudo feito cá com a mestria do Hugo Camarinha, irmão do nosso guitarrista Sid. Não acho que seja um desperdício gravar lá fora, porque é sabido que se vai obter um trabalho com qualidade e isso acaba por se reflectir no impacto que provoca nos ouvintes. Dou-te o exemplo de que estes temas tinham sido gravados antes, sem esta qualidade, e notamos uma grande diferença nas reacções. Muita gente nos veio felicitar pelos bons novos temas, quando são exactamente os mesmos que ouviram antes e não gostaram tanto. É óbvio que uma boa produção faz uma diferença enorme e, se uma banda tem a possibilidade de o fazer, acho que é a melhor opção. Também é um facto que, nesta altura, começa a ser mais acessível obter boas produções em Portugal. A evolução dos computadores nessa área tem permitdo fazer trabalhos com uma boa qualidade e de forma menos dispendiosa. Temos actualmente alguns bons estúdios de onde têm saído óptimas gravações. Os padrões de qualidade estão mais próximos, mas ainda há alguma distância, principalmente no aspecto em que alguns desses produtores de renome têm uma enorme experiência e podem ajudar uma banda a conseguir algo superior a um mero trabalho bem gravado num bom estúdio. E isso ainda faz muita diferença...

Quanto ao fantástico trabalho gráfico não deixa de ter alguma originalidade quando comparado com a maioria do encontrado em discos de Death Metal. Qual o conceito por trás desse trabalho ? E dos próprios Theriomorphic ?
Theriomorphic é algo que tem a forma de um animal. Há a visão religiosa do Homem feito à imagem de Deus quando, na verdade, o nosso corpo e o nosso organismo são semelhantes aos dos outros animais, principalmente os mamíferos. É o Homem como um animal, resultante da evolução das espécies e não uma escultura divina. É, por isso, o negar da existência de Deus ou outras entidades espirituais. Quanto ao grafismo, tudo começou com um pedido da artista Claudine Rodrigues para fazer uma ilustração baseada numa letra de um tema nosso. Julgo que ela tencionava fazer isso com várias bandas. Inicialmente, ocorreu-me fazer isso com o “Death Almighty!”, o tema que dava nome ao trabalho que nunca chegou a ser editado. Apesar de ser uma homenagem ao Death Metal, a morte toda-poderosa é aquela coisa invencível e eu sempre quis ter uma representação dessa ideia. Entretanto, surgiu a nova gravação e, como já não fazia sentido insistir no mesmo título, pensei no título “Enter The Mighty Theriomorphic”, por um lado, pela pujança da gravação e, por outro, porque com todo o tempo passado sem nada de jeito editado, mudanças de elementos, etc., achei que era um título merecido. Falei com a Claudine, que se disponibilizou para ilustrar a obra. O conceito acabou por surgir naturalmente, porque trocámos ideias acerca das diferentes formas como se poderia fazer essa abordagem... ela fez diferentes propostas e quando olhei para as pinturas achei que todas elas poderiam ser usadas para uma capa. Ao mesmo tempo, não conseguia optar só por uma e deixar as outras de fora. Apesar de serem ilustrações com estilos um pouco diferentes, todas elas encaixavam bem naquilo que eu pretendia, por isso decidi usar todas. Pedi à Claudine que me enviasse mais algumas ilustrações - aquelas caras que aparecem no interior - que acabaram por permitir que juntamente com algumas montagens de imagens se conseguisse ter uma ilustração relacionada com cada tema. Também digitalizei o papel em que ela pintou, para usar como fundo, e foi-se tudo complementando.

Nos créditos do vosso disco torna-se complicado perceber, entre os dois guitarristas da banda, qual deles faz o quê? Um é solista e outro ritmo ou intercalam essa função? O trabalho de guitarras do vosso disco é verdadeiramente alucinante… qual o segredo ?
Desde o início, sempre houve um intercalar de guitarras. Tendo duas guitarras, explorámos um pouco esse facto, em vez de termos duas guitarras a tocar quase sempre o mesmo. Os solos eram também habitualmente partilhados pelos dois guitarristas. Com a entrada do Sid, um excelente solista como se pode notar, a situação mudou um pouco. Ele permitiu levar as coisas a um nível muito superior, em termos de solos. Os temas gravados deveriam ter solos mais distribuídos, mas durante a gravação acabámos por lhe dar mais liberdade de acção, porque era a escolha mais natural. Se por um lado ele não tinha tido participação em termos criativos, por outro, acabou por poder contribuir com os solos e arranjos, que também foram fundamentais para o resultado final que todos podem ouvir. Neste momento, a composição já é feita mais em torno da capacidade dele, mas o Zé também faz alguns solos e leads, e continua a ser a grande mente criativa em termos de riffs. É o único que ainda está comigo desde o início, apesar de ter estado fora do país e saído da banda, acabando por regressar a Portugal e ao seu lugar nos Theriomorphic. Uma grande parte da nossa música é da responsabilidade dele, talvez mesmo a maior parte...

Sei que o baterista que gravou o disco abandonou recentemente a banda, certo ? O que se passou ? Já têm susbtituto ?
Resumidamente, o Mário tem a sua banda, Lvpercalia, e preferiu marcar um concerto com eles na mesma data de um dos concertos de apresentação do nosso álbum. O concerto já tinha sido marcado com o consentimento de todos os membros da banda, incluindo o dele que era igualmente um membro de Theriomorphic, já tinha sido feita alguma divulgação, havia uma edição da Loud! já em impressão com o anúncio do concerto e ele comunicou-nos três semanas antes que não tocaria nesse concerto, porque escolheu tocar com Lvpercalia. A partir daí, para nós e também para ele, foi a única decisão que havia a tomar. Pedimos a ajuda do Juca, de Bleeding Display e Sannedrin, que se prontificou a tentar aprender os temas do CD em duas semanas e conseguimos dar o concerto, graças ao empenho dele. Também tocou no dia 7 de Janeiro, no Lótus Bar, vai tocar no concerto com Dismember e, depois disso, vamos ver se já começamos a trabalhar com um novo baterista.

Os Theriomorphic conseguem transformar um disco de um estilo que muitos dizem obsoleto em algo extremamente cativante e interessante de ouvir e sentir. Achas que o facto de ser já dificíl de inovar em determinados estilos de Metal pode funcionar como uma desculpa para as bandas fazerem discos desinteressantes e repetitivos ?
Essa é uma questão que tem muito que se lhe diga. Não considero o Death Metal obsoleto, muito pelo contrário! A minha visão é, tal como o cruzamento das várias vertentes que tocamos, a de que o Death Metal é a evolução natural do Heavy Metal. Inicialmente, começou como uma ruptura, mas depois assumiu as suas raízes e acabou por se tornar num estilo tão vasto e variado, que não pode ser considerado obsoleto. Em termos gerais, podemos dizer que Nile, Vader, Opeth, Arch Enemy, Hypocrisy, Kataklysm, Dark Tranquillity, Behemoth e outras, são bandas de Death Metal. São todas bandas que soam de forma completamente distinta umas das outras e são também bandas que fazem sucesso e são consideradas das melhores da actualidade. Os fabulosos Death são uma banda intemporal, por exemplo. Mesmo entre os outros estilos, seja o Thrash, o Black, o Doom ou mesmo o Heavy, se notam uns toques de Death Metal, por vezes. No chamado Metalcore, então, é gritante. Muitas bandas só não são consideradas bandas de Death por causa das vozes, porque instrumentalmente pouca diferença há. Isso não aconteceria se o Death Metal não fosse um género ainda com muito para dar. Claro que tudo tem os seus limites e há o perigo de se entrar facilmente em saturação. Mas isso parte das pessoas e da sua capacidade de inovação. Há bandas que tocam praticamente o mesmo durante anos e ainda têm sucesso. Há outras que não trazem nada de novo e conseguem agradar. Há bandas que conseguem ser diferentes, mas não conseguimos gostar delas. Há aquelas em que tentam ser iguais aos outros e se esquecem de serem eles mesmos. Eu acho que quando as pessoas conseguem tocar aquilo que realmente lhes dá gosto, podem conseguir impressionar. Não acho que os Theriomorphic sejam propriamente inovadores. Não queremos descobrir a pólvora, queremos sim tocar aquilo que nos dá prazer e que nos soa bem a nós. Simplesmente, não temos regras do tipo “este riff não soa a Death Metal, por isso fica de fora”. Desde que todos gostem ou aceitem um riff, usamo-lo sem problemas. Daí conseguirmos uma mistura que não é tão habitual, comparando com outras bandas que têm o livro das regras à frente e não fazem nada que não esteja lá escrito...

O vosso som transpira uma grande influência sueca…estarei certo ? Quais as vossas principais influências musicais ?
Sim, a escola sueca está entranhada na nossa música. E está entranhada em muitos estilos e bandas de todo o mundo. Conseguiram aquilo que mencionei de assumir as raízes, adoptando melodia e harmonias de guitarra na onda de uns Iron Maiden e afins. Não é um Death Metal que nega as influências das bandas mais clássicas e, graças a isso, conseguiram criar algo mais fresco e cativante. No que fizemos até agora e está representado no álbum, há influências de At The Gates, Hypocrisy, Dismember e Vader, que eram aquelas que apontávamos como referência, porque eram bandas que todos os membros adoravam e as que mais marcavam o nosso trabalho. Com as mudanças de formação, isso diluiu-se um pouco. Já não há um consenso tão grande em termos de gostos, por isso é mais difícil apontar influências nesta altura. Também já temos uma certa sonoridade definida, acho que as influências de outras bandas acabam por não ser tão fortes como no início.

Quanto à internacionalização da banda…há alguma coisa a acontecer ? Achas que este disco é suficientemente bom para ombrear com discos de bandas de editoras como a Nuclear Blast ou a Metal Blade ?
Aos poucos, estamos a tentar chegar mais longe. O CD está disponível através da The End Records, nos Estados Unidos, e está ou vai ser distribuído em mais países. O facto de aí sermos uma banda desconhecida, pode dificultar um pouco, mas vamos tentar despertar a atenção. Essas são editoras com as quais não é fácil ombrear. Também é um facto que nem tudo o que lançam é verdadeiramente impressionante, mas têm uma forte promoção por trás e isso pode ser mais fulcral do que ter um disco bom ou melhor do que as bandas deles. De qualquer forma, acho que é um disco que pode agradar muito a quem o ouvir e não temos vergonha nenhuma de o ter como cartão de visita...

O que podemos esperar dos Theriomorphic a curto/médio prazo ?
Vamos ver se arranjamos um baterista permanente, para já. Em Abril, participamos em 2 dos maiores e mais antigos festivais de Metal: o Hard-Metal Fest, em Mangualde, e o SWR, em Barroselas e deveremos dar mais alguns concertos por essa altura. Para além disso, estamos desejosos de preparar material para voltarmos a gravar assim que for possível. O “Enter The Mighty Theriomorphic” é um retrato do trabalho feito durante os setes anos em que a banda esteve realmente activa, agora queremos retratar o que a banda é actualmente, com os temas novos que já temos, os que estão ainda incompletos e outros que ainda vamos compor. É possível que também se faça uma reciclagem num ou outro tema mais antigo, mas queremos essencialmente criar coisas novas...

Últimas palavras…
Parabéns pelo teu trabalho e pelas perguntas, que deram muito gosto em responder. Posso ter exagerado na extensão das respostas, mas tu é que puxaste por mim. Muito obrigado pela entrevista e desejos de muito sucesso para a Opuskulo!

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