terça-feira, setembro 23, 2014

Fanzices #0...My Putrid Spittle, Icon e Icontomb

Para além da enorme paixão e dedicação à música, tenho em comum com o Ricardo Ribeiro um passado ligado às fanzines...daquelas ainda mesmo em papel, verdadeiras obras de artesanato feitas na base do corte e costura, do improviso e de muita dedicação e carolice. My Putrid Spittle, Icon e Icontomb foram alguns dos projectos que o Ricardo tomou em mãos na segunda metade da década de 90 e que marcaram o movimento underground no qual se moviam. Ficam algumas impressões sobre essa experiência.  

Esta entrevista marca igualmente o início de uma série de artigos - "Fanzices" de seu nome - na qual irei autenticamente desenterrar alguns dos projectos que foram sendo feitos na mesma base daqueles que levaram o Ricardo a pôr mãos à obra. Sem prometer qualquer tipo de periodicidade, eles vão aparecendo, sendo que as vossas sugestões serão, obviamente, bem vindas. 




Durante o final da década de 90 aventuraste-te no saudoso mundo das fanzines. Fala-me dessa experiência e das memórias que guardas dessa época?

Sem querer ser saudosista, eram tempos muito bons.  Tinha-se contacto com pessoal de toda a parte do mundo, onde se trocavam cartas, cassetes, flyers, etc. fazia-se tudo com paixão e dedicação. Lembro-me que cheguei a enviar várias vezes moedas nas cartas para comprar algum item. Hoje em dia isso era impensável (risos)Era muito interessante acompanhar a evolução das bandas desde o seu início. Tenho muito orgulho em ter participado de forma activa na divulgação do “metal underground “. Estava sempre em pulgas à espera do carteiro para ver o que chegava de novo. Era uma desilusão quando não havia nada...(risos)

Achas que o esforço e a dedicação que projectos como uma fanzine exigiam alimentavam em nós um sentimento muito mais profundo de entrega e de vivência da música como uma paixão que nos arrebatava?

Sim, sem duvida. Eu vivia diariamente rodeado de música. Tinha um trabalho (familiar) que me permitia estar ligado ao movimento underground 7/8 horas diárias, 7 dias por semana. Era onde tinha o meu “headquarter” para fazer a fanzine/distro, correspondência, etc. Que  bons  tempos esses (risos). Hoje em dia já não consigo fazer isso.

O que te levou a terminar esses projectos? Alguma vez sentiste o ímpeto de voltar a fazer algo, ainda que adaptado às novas tecnologias?

Ao mudar de emprego fiquei sem tempo para dedicar ao projeto.  Gostava de ter continuado ligado à cena musical, talvez não como fanzine, mas como editora, acho que era o caminho natural a seguir. Na altura ainda cheguei a editar a demo dos Howl.  Gostava de ter uma editora apenas para edições de “luxo” e limitadas, só direccionada para coleccionadores. O dito cd “normal” está morto, hoje quem realmente compra discos quer edições especiais e limitadas. Espero estar enganado, mas é a sensação que eu tenho.

Durante anos, as fanzines tornaram-se em autênticas bíblias de preciosa e escassa informação sobre as nossas bandas favoritas e sobre o que ia acontecendo a um nível mais underground. Como encaras agora toda a facilidade de acesso à informação que a internet veio proporcionar? Acabou por perder-se irremediavelmente um certo fascínio e um lado mais misterioso da música?


Sim, esse fascínio está a perder-se. Hoje em dia somos “bombardeados” com tanta informação, tantas músicas, tantas bandas, acaba por não se dar o devido valor. Mas para mim o mais preocupante é que eu acho que se está a perder o conceito de “álbum”.  Sinto que hoje em dia a maior parte do pessoal “saca” 1 ou 2 faixas que mais se gosta ou vai-se ao Youtube e ouvem-se musicas soltas, não álbuns completos. Está a perder-se o respeito pela musica. Apesar de tudo, a internet usada devidamente é um excelente meio de divulgação e promoção para a música.

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